sábado, 23 de maio de 2009
Emoções à flor da pele.
Este é um artigo que ajuda as crianças a reconhecerem o papel das emoções. Os resultados reflectem-se na relação com os pais, com os amigos e no próprio ambiente escolar.
«Mãe, quero ver televisão». Rita Praça interrompe a conversa com a amiga para dar atenção a Rodrigo. «Vou pedir-te uma coisa, achas que este é o momento mais adequado para veres televisão? A mãe está a conversar, achas que é o mais indicado?» Rodrigo, de seis anos, olha e diz: «Eu queria tanto, mas tens razão, agora não podes. Estás a conversar e se eu ligasse a televisão ia fazer muito barulho. Pronto, vou jogar às espadas e quando acabares deixas-me ver um bocadinho». Ao que a mãe responde, «correcto, acho que é justo e está combinado». A amiga de Rita nem quer acreditar no que acabou de testemunhar. «Ele não fez nenhuma birra? Não se atirou para o chão? Não discutiu?» Nesse momento Rita sentiu-se orgulhosa do filho e cada vez mais consciente da importância da inteligência emocional (IE) no crescimento de uma criança. «Até chegar a esta fase o Rodrigo fez birras como qualquer miúdo, mas conversávamos. É importante explicar aos mais novos por que não podem fazer o que lhes apetece, não é só dizer não fazes porque não quero, isso é horrível, é a antítese da IE», um conceito originalmente defendido pelo psicólogo Daniel Goleman que acredita que «a chave para tomar boas decisões pessoais é ouvir os sentimentos».
A importância das emoções
Foram os resultados obtidos com Rodrigo que levaram Rita Praça a unir-se a Paula Pinto para juntas formarem uma empresa que coloca em prática as teorias que estão na base desta disciplina. «Em Portugal só agora se começa a em IE, mas no estrangeiro já é comum as escolas proporcionarem no currículo académico a possibilidade da criança desenvolver esta capacidade desde muito cedo como uma actividade extracurricular. É tão normal como a arte dramática ou o teatro para os mais novos, é uma questão de mentalidades», explica Rita Praça.
Mas caso a criança possua uma relação saudável com os pais, tenha facilidade em fazer amigos e boas notas na escola também poderá tirar partido da aprendizagem da IE? «Sim, irá fortalecer as relações interpessoais, as dinâmicas quer com a família, quer com o grupo, e portanto vem criar a capacidade para se tornar cada vez mais sólida naquilo que são as suas bases afectivas e naquilo que é o seu menu emocional, na forma como lida com os outros. Vai criar a possibilidade de, na adolescência, ser mais assertiva e com capacidade de se autonomizar no grupo».
«Crianças e jovens inteligentes emocionalmente conseguem adiar uma recompensa ou fontes de gratificação ao controlar os seus impulsos. Conseguem agir com maior segurança, têm uma melhor adaptação às situações de stress, sendo, como costumo dizer a alguns pais de crianças inteligente emocionalmente, ‘sedutores’, porque sabem como agir, como comunicar com o outro e como transmitir os seus sentimentos», reforça Cristina Camões que chama a atenção dos pais para este conceito. «A família constitui igualmente um espaço no qual poderá ser desenvolvido este tipo de inteligência. Os pais desempenham um papel importante neste processo, já que a família constitui a primeira escola de aprendizagem emocional da criança. Pais e educadores deveriam adoptar um papel activo no treino deste tipo de competências.»
Pais emocionalmente inteligentes
Para os pais que sintam curiosidade em saber algo mais sobre IE já existem workshops denominados Educar Com Inteligência Emocional. «É explicado o que é a IE, o que se faz com as crianças, o que se pode fazer e depois vamos ouvi-los. Queremos saber quais os seus receios e as dificuldades que têm com os filhos. Se fazem birras damos dicas, dizemos para experimentarem isto ou aquilo e para nos dizerem os resultados na próxima sessão. Até podem telefonar, não queremos pais ansiosos», diz Rita Praça, que ensina o que fazer quando os mais pequenos testam a paciência dos pais com grandes birras. «Se está a chorar e a deitar tudo ao chão, a primeira coisa que deve fazer é chegar perto dele, abraçá-lo, dar-lhe um beijo e dizer: ‘estás a fazer uma birra porquê, és tão lindo, adoro-te’. Ele vai pensar: ‘espera lá, não se zangou’. E continuar: ‘és tão lindo que de ti só espero o melhor, mas como estás a fazer uma birra o meu coração está triste’. Eles ficam a olhar para nós, percebem tudo. Depois é só rematar com: ‘tu és capaz de te portar bem, acredito em ti’. Pode não resultar à primeira, mas ao fim de várias tentativas vai ouvir: está bem mãe».
Refeições à prova de birras
A refeição pode ser a altura que as crianças identificam para se portar mal porque sabem que vão criar frustração no adulto e vão despoletar um conflito. Em vez de perder a calma, experimente seguir alguns conselhos. «Normalmente as mães têm uma ansiedade muito grande caso a criança não coma. Se forem saudáveis, vão comendo porque vão crescendo e o peso vai aumentando. Podem não comer tanto como a mãe gostaria, mas provavelmente comem o suficiente. E a ansiedade da mãe passa para a criança que está a ser obrigada a comer», explica Paula Pinto, bióloga e especialista em nutrição. Então o que dizer, ‘se não quiser comer não come? ‘ «Claro que não. As crianças percebem tudo e se começar com o discurso «come, já te disse para comeres, não te levantas da mesa enquanto não acabares ou se não comes a bem comes a mal», tudo o que vai conseguir é que não coma mesmo nada. O que muitas vezes resulta é ler uma história do corpo humano que explique a importância dos legumes, como por exemplo: ‘depois vêm as gripes, mas o legume está lá e defendeu-te’». Os jogos para ver quem acaba primeiro a refeição também resultam. «Existem várias formas de os motivar, mas não existe uma fórmula mágica. Há que respeitar o facto de não gostar mesmo de algum alimento. Por exemplo se não gosta de brócolos, gosta de feijão verde e pode colocar os brócolos na sopa».
Cinco dicas de orientação emocional
A base da educação – familiar e escolar – é a empatia, ou seja, a capacidade de reconhecer as emoções dos outros, de compreender aquilo que o outro sente e de lhe transmitir consolo. Esta anda de mãos dadas com a negociação e pode ser utilizada tanto pelos pais, como por professores. Eis cinco fases do processo de orientação emocional desenvolvidas por Cristina Camões:
1. Ter consciência das emoções da criança. Os estudos revelam que para os pais poderem saber o que os filhos estão a sentir, devem ter primeiro consciência das suas próprias emoções e só então poderão reconhecê-las nos seus filhos
2. Reconhecer a emoção como uma oportunidade para a intimidade e aprendizagem
A emoção muitas vezes sentida pela criança é negativa, um teste que correu mal, uma traição de um amigo, todas estas experiências negativas podem funcionar como oportunidades excelentes para sentir empatia, para criar intimidade, para ensiná-las a enfrentar e a dar nome aos seus sentimentos
3. Escutar com empatia e validar os sentimentos das crianças. Escutar com empatia nem sempre é fácil, é necessário recorrer à imaginação para ver a situação na perspectiva da criança.
Por vezes revela-se muito mais difícil para os pais, pois quando pensam nas reacções dos filhos pensam como adultos, mas é preciso entender com o coração o que a criança está a sentir
4. Ajudar a criança a classificar verbalmente as emoções. Trata-se de dar nome ou significado às emoções: ‘sentes-te triste’, ‘zangado’, ‘preocupado’. Ao dar significado, o que sentem como assustador revela-se menos incómodo
5. Estabelecer limites ao mesmo tempo que se ajuda a resolver o problema. Ensinar a criança a ter respeito, mostrar-lhe a importância da responsabilidade, no fundo estabelecer limites, à medida que se vai encontrando a solução para o problema. Pode parecer difícil inicialmente, mas com a prática torna-se automático.
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